VOZ! Embora muitas vezes pareça que não a temos, ela está lá. Às vezes baixinha, noutras, alta. Às vezes ouvida, noutras, abafada. Se não a usamos, perdemos de muitas formas: visibilidade, acolhimento, justiça. Não a Justiça como PODER, porque não acredito nela. Mas uma espécie de justiça humana é possível e viável quando a voz de uma é potencializada. Foi o que aconteceu com as jogadoras do time feminino de futebol do Santos. Apesar da proteção do presidente do clube, amigo e muito próximo do acusado de assédio, que não ouviu as denúncias e manteve o técnico no cargo.
Para quem não está por dentro do assunto: em setembro de 2023, Kleiton Lima foi acusado de assédio moral e sexual por jogadoras em cartas anônimas. À época, ele entregou sua função. Sete meses depois, o treinador retornou ao Santos, negando todas as acusações. O presidente do time paulista defendeu o treinador e invalidou as denúncias. Segundo a direção do time, que afirma ter investigado o caso, eles determinaram a “inverdade”dos fatos.
Disse o presidente do Santos: “Se eu tivesse uma mínima ou qualquer tipo de fato concreto e que pudesse ser provado que ocorreu algo grave, envolvendo qualquer pessoa, seja ela atleta ou funcionária, imediatamente tomaremos as medidas cabíveis. Até esse momento não temos nada”. Ele também disse que não aceitaria pressão. O técnico decidiu, então, renunciar.
As jogadoras não se calaram. A pressão cresceu. Os protestos ganharam força. As vozes não se calaram. E o técnico pediu demissão. Vitória? Não. Um passo à frente dado? Sim.
Quanto vale a palavra de uma mulher? Quanto vale a palavra da vítima de um abuso? De um assédio? Me pergunto sempre, porque a resposta não existe. Ou melhor, ela existe diz que não vale nada. 19 atletas denunciaram assédio moral e sexual. Mas as suas palavras não valeram nada para o dirigente santista.
Triste é saber que isso é comum e frequente. Essa é a regra. Não denuncie homens brancos, ricos e poderosos. Se você, mulher, ousar fazer isso, será desacreditada. Chamada de louca. De vingativa. Dirão que seus hormônios estavam em curto-circuito. E assim eles vão se protegendo, se perpetuando assediadores. Sim, porque quem assedia uma vez, assedia sempre. Ele sabe da impunidade. Ele sabe será protegido por seus pares. Até quando?
Até a justiça, através das suas diversas instâncias, começar a ser feita. Não há reparação financeira para os estragos de um assédio. Assim como não há reparação financeira para os casos em que a omissão do poder público vitimiza a mulher assediada e agredida quando busca justiça. Estupro na Espanha tem preço? Sim. E o assédio no Brasil? Bom, esse parece estar sempre em promoção, com grandes descontos e preço bem baixinho. Tão baixinho que sequer ganha espaço na imprensa.
Até quando? Até todas as vozes serem ouvidas da mesma forma. Até os omissos e cúmplices dos assediadores acordarem. Se não entendem simplesmente porque é o certo, aprenderão por terem, em algum momento, uma vítima em sua família. Eu desejo que acordem antes. Não desejo a ninguém ser vítima de assédio, buscar amparo e acolhimento e ser vítima de novo: da justiça, dos pares e da sociedade.
LEMBRE-SE SEMPRE: Quando você relativiza uma denúncia ou um relato, você relativiza uma das poucas coisas que uma ainda mulher tem: sua voz.